3. O Sofrer no Trabalho e o Impacto na Saúde
3. Como a medicalização está se tornando uma resposta comum às exigências de alta performance? Iremos explorar a crescente preocupação com a saúde mental no ambiente de trabalho e conhecer os impactos alarmantes revelados por uma recente pesquisa sobre a saúde dos bancários. Entenda o papel crucial do PCMSO, das CIPAs, do SESMT, dos Sindicatos e outras Instituições Referência em Saúde na promoção de um ambiente de trabalho saudável e sustentável. Discutiremos sobre como defender a saúde e a vida dos trabalhadores, por meio do debate para construir políticas mais integrativas e humanizadas.
Alberto Erich Okada (CRP 01/25.551) e Amadeu Alvarenga (Movimento Saúde)
5/4/2024


Nos ambientes de trabalho modernos, temos observado uma tendência preocupante de aumento no uso de medicamentos para tratar insônia, ansiedade e problemas de atenção. Esta realidade, reflete uma verdadeira epidemia de medicalização, mostra como o uso de substâncias se tornou uma solução rápida para demandas de alta performance e produtividade. Esta prática exige uma atenção significativa, já que o abuso de medicamentos está se tornando cada vez mais comum.
Segundo a pesquisa, divulgada em abril/24, "Avaliação dos Modelos de Gestão e das Patologias do Trabalho Bancário", realizada pela Contraf-CUT em parceria com a Universidade de Brasília (UNB), revelou preocupantes condições de saúde entre trabalhadores do setor financeiro. De acordo com o estudo, 80% dos bancários reportaram problemas de saúde relacionados ao trabalho no último ano. Destes, quase 50% estão em acompanhamento psiquiátrico, com 91,5% utilizando medicações prescritas, em contraste com 64,4% dos que estão em outros tipos de acompanhamento médico. Estes dados destacam a crítica necessidade de revisão nas práticas de gestão do trabalho bancário para melhorar o bem-estar dos funcionários. (CONTRAF-CUT, 2024)
A cultura de competição exacerbada, muitas vezes impulsionada por uma inadmissível meritocracia implacável nas empresas e cria um ambiente onde os trabalhadores se sentem compelidos a superar seus limites. Este cenário promove o uso de substâncias que prometem melhorar o foco e a produtividade, uma prática extremamente perigosa quando não acompanhada por supervisão médica adequada. Além dos riscos à saúde física e mental, esta dependência frequentemente oculta os problemas subjacentes que necessitam de abordagens mais sustentáveis e holísticas.
Ademais, o estigma ainda associado à busca por ajuda, quanto às questões de saúde mental, pode impedir que os trabalhadores procurem o suporte necessário, perpetuando um ciclo de dependência e falta de tratamento adequado das causas fundamentais de seus problemas. Muitos dos que recorrem ao uso de medicamentos, o fazem sem a devida participação em psicoterapia ou outros tratamentos de apoio, resultando em uma abordagem de tratamento incompleta que não só falha em abordar eficazmente os problemas mentais, mas também contribui para a deterioração contínua do bem-estar do indivíduo.
É imperativo que as empresas instadas pelos Sindicatos dos Trabalhadores, com a participação decisiva das Instituições Referências em Saúde, das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPAs), em conjunto com o SESMT (Serviço Especializado de Segurança e Medicina do Trabalho), responsáveis pela identificação dos fatores psicossociais associados aos riscos ambientais e suas respectivas ações preventivas, também em conjunto com o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), tomem medidas proativas para enfrentar esses desafios.
A implementação de políticas que promovam uma compreensão mais profunda dos impactos na saúde mental ocupacional e o desenvolvimento de estratégias que incentivem os trabalhadores a buscar ajuda de maneira aberta e sem medo de repercussões são passos fundamentais.
Resignificando a atuação das CIPAS
Diante da importância do papel das CIPAs, cabe aos Sindicatos apoiarem e participarem ativamente do processo eletivo de seus membros, para uma representação legítima dos trabalhadores, além de dar total às CIPAs no curso de seu mandato.
As CIPAs, que tradicionalmente focam suas atividades na ergonomia do ambiente de trabalho, como adequação de mobiliário, iluminação e controle de ruído, precisa expandir sua atuação para abranger também a saúde mental e os riscos de adoecimento de natureza ocupacional. Isso incluiria apoiar iniciativas de capacitação e campanhas de prevenção e cuidados com a saúde mental. Ao ampliar seu escopo de atuação, as CIPAs podem desempenhar um papel crucial na promoção da saúde mental, propiciando um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo.
Ao implementar essas mudanças, as CIPAs podem apontar problemas que podem causar sérias consequências ao agravamento de danos à saúde mental, o que por sua vez pode prevenir o agravamento de outras doenças fisiológicas, promovendo uma relação de trabalho cada vez mais humana. Esta abordagem pode ajudar a reduzir a dependência de medicamentos e fomentar estratégias de bem-estar mais sustentáveis entre os trabalhadores, destacando a importância de uma atenção integral à saúde no contexto corporativo.
Importância do PCMSO
A recente atualização da Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho pelo Ministério da Saúde, que incluiu condições como burnout, ansiedade, depressão e tentativas de suicídio, sublinha a crescente preocupação com a saúde mental no ambiente de trabalho.
Essa mudança provoca uma necessidade de compreensão mais profunda de como o ambiente de trabalho e as exigências ocupacionais podem afetar significativamente o bem-estar dos trabalhadores.
Historicamente, as doenças ocupacionais estavam mais associadas às questões físicas decorrentes do ambiente de trabalho. Contudo, o reconhecimento de patologias mentais como consequências diretas das condições de trabalho representa um avanço crucial no entendimento da saúde ocupacional. Entre 2007 e 2022, o SUS atendeu quase três milhões de casos de doenças relacionadas ao trabalho, evidenciando a magnitude do problema.
Diante desse contexto, torna-se imperativo revisar o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO). Tradicionalmente, focado no mapeamento do estresse e de aspectos fisiológicos da saúde do trabalhador, o PCMSO deve ser expandido para incluir uma abordagem mais completa, que contemple as diversas condicionantes inerentes à saúde mental, trazendo os sintomas de sofrimento no trabalho e sua correlação aos fatores de riscos ocupacionais psicossociais. Este programa deve orientar não apenas o diagnóstico e o tratamento, mas também orientar a prevenção de doenças mentais associadas ao trabalho.
As Instituições Referências em Saúde da empresa e dos trabalhadores devem intervir com o fundamento da Atenção Primária para possibilitar o efetivo controle epidemiológico e determinar a elaboração de políticas de prevenção, além de desenvolver com excelência os processos de saúde-doença.
Implementação de Políticas de Controle Epidemiológico
É crucial implementar políticas de controle epidemiológico que permitam identificar e mitigar os riscos psicossociais nos ambientes de trabalho. Estas políticas devem incluir: (a) revisão das diretrizes do Exame Periódico de Saúde (EPS) que permita identificar fatores ocupacionais de risco psicossociais, com direcionamento à atenção primária à saúde; além de exigir a necessidade de fazer respeitar os limites físicos e emocionais do trabalhador, com cargas de trabalho adequadas, a fim de promover um equilíbrio saudável entre vida profissional e pessoal; (b) Monitoramento do Uso de Medicamentos: Trabalhar em conjunto com os serviços de saúde ocupacional (médicos e psicológicos) das Instituições Referência em Saúde, para monitorar e revisar o uso de medicamentos relacionados ao desempenho no trabalho, garantindo que os trabalhadores recebam o acompanhamento necessário, a fim de mitigar o risco de dependência.
Cuidar da saúde mental dos trabalhadores não apenas melhora a qualidade de vida do trabalhador, mas também traz benefícios tangíveis para a comunidade.
Em suma, a incorporação de doenças mentais na Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (em nov/2023) e a necessidade de um controle epidemiológico que contemple as novas doenças ocupacionais provoca uma mudança paradigmática na maneira como a saúde ocupacional é compreendida e gerida. É vital que as empresas reconheçam a importância dessa mudança e adaptem seus programas e políticas para criar um ambiente de trabalho verdadeiramente saudável e produtivo.
Revisão Bibliográfica
CONTRAF-CUT. (2024). Bancos “descobrem” que seu modelo de gestão afeta a saúde mental dos trabalhadores. Publicado em 11/04/2024. Acesso em 01/05/2024, em https://contrafcut.com.br/noticias/bancos-descobrem-que-seu-modelo-de-gestao-afeta-a-saude-mental-dos-trabalhadores/
Contato
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+55 61 99175-0407
Expediente
Coletivo Saúde do Trabalhador
Afiliado ao Instituto Humanos Sem Fonteiras em Prol da Sustentabilidade e Bem-viver, em 01/maio/2024.
Equipe Editorial
Alberto Erich S. de P. Okada - Psicólogo CRP 01/25.551
José Amadeu Alvarenga - Movimento Saúde
Marcos Antônio Figueiredo Filho - Bancário
Dedilson Nunes da Silva - Movimento Saúde
